quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Dia de Regressar




A preparação começou com semanas de antecedência. Fui aos correios, enviei uma encomenda endereçada a mim mesmo, mas para o Barreiro. Duas camisolas e dois cachecóis seguiam antes de nós para o Continente.

Naquela Quarta feira, acordámos cedo para apanhar o avião. O dia estava bom e o decidimos seguir logo para o destino mais ansiado. Estacionámos à porta do Estádio e fomos contemplar logo o Estádio lá de cima. A cara dos meus filhos a olhar deslumbrados para a imponência do Estádio da Luz, a ver o contraste do verde da relva com o vermelho das bancadas e imaginar o estádio repleto de gente. É um momento único, quando percebes que a tua paixão também é a deles. Seguimos para a loja para comprar os bilhetes, era um Benfica Rio Ave, mas para mim era o jogo mais importante de todos! Finalmente tinha um bilhete com o meu nome e mais dois, um para o meu pai e outro para o meu irmão.

Saudades quebradas, adiei até Sexta Feira para abrir a encomenda com o meu pai. Ele percebeu logo que uma das camisolas era para ele e que iria levá-lo a casa novamente. O sentimento dele era tão forte quanto o abraço que me deu nesse momento. Disse-lhe que tinha medo, pois poucos meses antes um AVC, quase o levava de mim, mas sabia que ele queria aquilo tanto como eu.

No Sábado, dia de jogo, acordámos os dois muito cedo. Preparámos um pequeno almoço reforçado e decidimos sair no barco das 11 da manhã. “O jogo não é só às 16?! Porque é que vão tão cedo?!” perguntavam elas, desconhecendo que “ir à bola” tinha todo um ritual. Vestimos as nossas camisolas, ajeitámos os cachecóis e lá fomos até ao barco. Já lá dentro, a família foi crescendo, pois outros como nós iam para a “missa” na Catedral da Luz.

Já na Luz, e com tempo, fomos cumprir o ritual de sempre. Fomos até à roulotte comer uma bifana e beber uma imperial. O meu irmão estava como sempre atrasado, mas estávamos em casa, não havia qualquer problema. Fomos até junto de um grupo de Facebook do qual fazemos parte e por ali ficámos como se estivéssemos estado com eles no fim de semana passado. O Benfica é sobretudo isto, a amizade entre pessoas que são tão diferentes mas que têm um amor ao Benfica. Ali todos somos iguais e todos nos sentimos únicos. Quando meu irmão chegou finalmente, o abraço entre os três é um misto de saudade e de Benfiquismo. Nunca antes fomos os três “à bola” juntos.

A hora chegou. As portas já deixaram entrar os primeiros adeptos e já podemos ir. Sim, é cedo, mas quero aproveitar todos os momentos em casa. Passamos os torniquetes, subimos e eis o momento esperado. Ali no alto no Piso 1, fiquei largos minutos a ver aquele imponente gigante que é ao mesmo tempo a minha casa. Senti o cheiro da relva, o arrepio de regressar, senti o toque do 3º anel e soltei um “Estou em casa!”. Desci até ao meu lugar e ali fiquei a ver as pessoas a entrar. Ali, num momento só meu, olhava as pessoas ao meu redor e percebia como algumas coisas tinham mudado. Uns tiravam selfies, outros fotografavam tudo e todos, havia quem estivesse ao telefone, outros jogavam nos telemóveis… e eu… eu bebia Benfica, pois aqueles momentos eram eternos para mim e não era um fotografia que ia absorver o que eu estava a sentir. Seguiu-se o aquecimento, os aplausos e o voo da águia. O coração disparava de adrenalina e quando por fim ecoa o hino do Piçarra, os olhos cravaram-se de lágrimas e os três, abraçados uns aos outros, cantámos o hino do nosso amor.

O jogo começa, como todos os outros começavam, a pedir desculpa a quem estava a trás por não me conseguir sentar, mas eles eram como eu… Aplausos, gritos, insultos e assobios. Foram 45 minutos de futebol sofrido e ao intervalo, o um igual deixava todos em sobressalto. O senhor de idade ao pé de mim, sofria por todos nós. Dizia que já tinha voltado a fumar depois de um jogo destes. Eu tranquilizei-o dizendo que não tínhamos feito 1700 km para ver o Benfica perder. Íamos dar a volta aquilo! E foi o que fizemos!

Na segunda parte, Raul entrou e no final do jogo marcou dois golos na baliza do lado oposto. Por cima de nós, os Diabos foram incansáveis e cantaram até ao fim e nós li por baixo, ajudámos cada palavra! Aos 90 e poucos, o árbitro apitou. Já muitos tinham saído do estádio e era a debandada. Aos poucos as bancadas iam ficando vazias e o som ecoado do estádio desaparecia. No cimo da bancada, ali estava eu, sozinho de braços abertos, olhando o Estádio praticamente vazio. Sentia o cheiro de terra molhada do relvado a ser regado, ouvia os passos de quem desmontava tarjas do outro lado do Estádio e despedia-me de casa. Os placards desligaram e o funcionário veio pedir-nos para sairmos…
Sei que um dia vou voltar a casa Benfica! Obrigado Benfica!

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